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Profundanças

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Viagem ao centro da roda

2014: o ano em que levei a sério os versos do nosso Jorge de Souza Araújo: “preciso tomar uma providência em minha vida/ preciso tomar uma vida em minha providência…/ preciso tomar uma/ preciso tomar ar”. Resultado: consciente de que não havia escapatória, decidi adiar a publicação do meu terceiro livro de poemas e embarcar, de vez, numa ação coletiva.

Nesses últimos três anos assumi até o talo a condição de migrante pendular. Acentuaram-se as andanças, os trânsitos e, por consequência, as interações com pessoas incríveis, diversas. Mulheres, sobretudo. Mulheres que tem mania de se vestir com palavras. Foram incontáveis os encontros inusitados – em locais improváveis. Vez outra era convidada a escutar poemas, trechos de crônicas ou contos. Fosse pelas ondas da virtualidade ou no encontro sob um sol abrasante, o certo é que desenvolvi a vontade de alinhavar.

Tantas conversas causaram perturbações. E o incômodo maior era esse: as gavetas engolindo tantos escritos. A cena se repetindo em lugares tão díspares (Recife, Itabuna, Feira de Santana, Ilhéus, Garanhuns, Brumado, Salvador). Gaveta: vala comum? Dessa perturbação surgiu a ideia de organizar uma antologia literária.

A primeira coincidência que notei entre essas mulheres: o ativismo na formação de leitor@s. Aos poucos ficou perceptível que o interesse pela Literatura ia além e resguardava experiências íntimas de escrita. Ou seja, essas mulheres, apesar das experiências de leitura e/ou difusão literária, repetiam a cena do engavetamento de textos e, cada vez mais, eram acentuadas as distâncias com possíveis leitor@s.

Conhecendo de perto a escrita dessas mulheres e com a ânsia de ampliar as possibilidades de interações, passei a levar mais a sério a ideia de organizar uma antologia que trouxesse à tona o que se chama de “cadeia ininterrupta de insurgências” (C.f. SPIVAK). O lugar ocupado pela literatura na vida dessas “comedoras de proibidos frutos” é imenso: forma de sobrevivência(s), contragolpes certeiros, antídoto ao desencanto.

Aqui estão autoras inéditas, autoras que já divulgaram seus textos via internet (mas que nunca publicaram livro individual) e ainda autoras que publicaram somente 01 livro individual. E como a literatura sempre se abre a outras possibilidades de diálogo, veio a necessidade de inserir o trabalho de jovens fotógraf@s sensíveis às formas de resistência feminina. Portanto, para cada autora convidada contamos com um/a fotógraf@ que produziu um ensaio cujo foco é a revelação da presença feminina nos seus espaços de origem/atuação. A atmosfera de cada ensaio foi de livre criação d@ fotógraf@ correspondente.

PROFUNDANÇAS, desde a sua gênese, se apresentou como um projeto colaborativo, sem fins lucrativos. Agora, com a materialização deste livro, digo/dizemos: a principal intenção é conferir visibilidade às produções que encenam outros lugares para os corpos de mulheres, bem como a diversidade nas formas de autorrepresentação.

Quem participa de ritual(is) sabe que há o segredo. Aquilo que só pode ser retratado na memória, no baú de lembranças, pois, sendo parte íntima da ritualística, é compartilhado por poucos. Há, também, no ritual, o que pode ser dito, dado ao conhecimento a círculos maiores. Respeitando as dinâmicas do segredo PROFUNDANÇAS pendula entre o guardado e o transbordado das gavetas dos dias. No intermédio: as expansões dos seres.

SEGREDO, PACIÊNCIA, FLUIDEZ, SINTONIA. APRENDIZADO DA CALMA, DA ESPERA. TEMPORALIDADE OUTRA. Fiquei pensando nesses elementos….
ainda mais nos contextos de organização virtualística do cotidiano. Em tempos de redes sociais e marés virtuais o tempo se organiza apressadamente. Há enxurradas de imagens, informações.  O tempo do nosso ritual é outro. E, junt@s, estamos desaprendendo, reaprendendo. Nem tudo está previsto, mas muita coisa está acontecida.

Façamos uma roda. Vamos dar as mãos. Vamos voltar os nossos olhos para o centro da roda. De lá emana a energia que se espalha. Na roda não há hierarquia…
Sabem aqueles rituais de nomeação? A criança vem ao mundo, é dançada, cantada, mergulhada em águas e as palavras se reorganizam para significar essa existência nascente.

O nome, a palavra. É preciso uma temporalidade desaprendida para que a nomeação se faça. Fluidezas trouxeram à tona uma palavra inventada: PROFUNDANÇAS.

Agô às forças do universo! A criança está entre nós.

Daniela Galdino 

facebook.com/profundancas

Organização: 

 Daniela Galdino

Produção: 

Voo Audiovisual

Assistentes de produção: 

Cajuh Almeida e Dandara Galdino

Arte final:

Binho Brill

Autoras:

Belisa Parente, Brisa Aziz, Calila das Mercês, Celeste Bastos, Daniela Galdino, Fernanda Limão, Lorenza Mucida, Márcia Soares, Potira Castro, Raquel Galvão, Renailda Cazumbá, Say Adinkra, Valquíria Lima.

Fotógrafes: 

Amanda Pietra, Ana Lee, Andreza Mona, Augusto Flávio Roque, Emuanuela Alves, Eline Luz, Fafá M. Araújo, Guigo Amaral, Jéssica Sueli, Luiza Cazumbá, May Barros, Martinho Souza, Pedro Liberal e Ravena Revenster.